domingo, junho 16, 2013

Irmãs Meireles

As irmãs Meireles recepcionadas no Rio, para cantarem na Rádio Nacional (A Cena Muda, 1947).

Irmãs Meireles — Trio formado pelas portuguesas Cidália Meireles (Porto, 09/05/1925 —), Rosária Meireles (Porto, 11/10/1926 —) e Milita Meireles (Porto, 25/09/1928 —). Estiveram no Brasil, na década de 1940, fazendo sucesso na Rádio Nacional.

Cidália Meireles começou a carreira artística cantando na Rádio Nacional de Lisboa, em 1941, formando, em 1943, com as suas irmãs Milita e Rosária, o Trio Irmãs Meireles que obteve, em 1944, o primeiro prêmio do concurso de "Conjuntos Vocais". Em 1947 iniciaram a carreira internacional atuando no Brasil e noutros países da América do Sul (Chile, Argentina).

Em 1949 regressaram ao Brasil, a convite da Rádio Record, vindo a fixar aí residência. Iniciaram a temporada na Rádio Record no sábado, 3 de Setembro as 21:30 horas. Cantavam sempre as terças, quintas e sábados no mesmo horário, sob o patrocínio do Sabão Albatroz, Tintas e Vernizes Cil e Conhaque Ipiranga.

Era o pai das meninas, José Meireles, quem administrava os contratos e o dinheiro. Elas afirmam que ganharam verdadeira fortuna. Foi com esse dinheiro que o Sr. Meireles adquiriu três hotéis no Brasil.

A gravadora Sinter aproveitou para lançar, entre Dezembro de 1950 e Janeiro de 1951, alguns discos das irmãs Meireles. Milita gravou sozinha um disco de boleros. E como trio gravaram um fado e um corridinho da autoria de Antônio Mestre, o tema "Minha linda lusitana" (marcha carnavalesca de Claribalte Passos e Jorge Murad) e o frevo canção "Morena de Copacabana".

Após o casamento, Cidália Meireles passou a residir em São Paulo, onde cantou na Rádio Record de 1954 a 1964, tendo apresentado programas de sucesso como “Viajando com Cidália Meireles”.

Ganhou também diversos prêmios, entre outros, o prêmio "Roquete Pinto" nas categorias de "Melhor Cantora de música popular internacional" e "Melhor programa de TV", e o troféu “Guarani”, o mais alto prémio na industria fonográfica, para o melhor álbum de música internacional do ano de 1957 pelo disco "Adega da Cidália".

Cidália apresentou programas na TV Brasileira como "Adega da Cidália" (a partir de 1956), "Cidália mais perto de Portugal" e "Cidália se diverte". Foi igualmente uma das estrelas da série de programas “O Fado e o Samba”, reunindo Cidália Meireles e Isaura Garcia na TV Record e protagonizou também na TV Record, a série "Severa" que deveria durar um mês, mas que, devido ao enorme sucesso, se prolongou por mais dois meses.

Em 22 de Janeiro, às 20 horas, Rosária Meireles começou sua temporada na Rádio Nacional e TV Paulista, canal 5, durante três meses. Atuou, nos Estados Unidos, como figura permanente nos programas de Steve Allen, na televisão NBC, tendo também atuado ao lado de Vic Damone, na CBS-TV.

Estão no Rio as famosas Irmãs Meirelles


Lisboa, Abril — "Desde há muito que andava no ar a notícia de que o nosso famoso trio Meireles iria ao Brasil e, possivelmente à América do Norte. Mas desta vez era certo. O Costellation da Pan América as levou ao Rio, mas antes do embarque as festejadas artistas tiveram a gentileza de falar à Cena.

Deixamos aqui arquivadas como resultado dessa entrevista algumas notas biográficas desse famoso trio.

As três irmãs Meireles nasceram no Porto, na tão característica freguesia do Bonfim. Berço de artistas e intelectuais da mais fina estirpe, aquela cidade ser orgulha de ter dotado a Rádio Portuguesa do seu conjunto vocal mais categorizado, e ao mesmo tempo com três valores individuais que estão longe ainda de haverem atingido a plenitude das suas faculdades.

Cidália Meireles (A Cena Muda, 1947)
É Cidália, a mais velha das três (nasceu a 9 de maio de 1925), a que primeiro estreou no rádio como profissional (11 de Outubro de 1942). Antes, porém, já as três talentosas jovens haviam dado largas à sua vocação artística, tomando parte, na sua cidade natal, em vários recitais poéticos e coreográficos e em emissões infantis que serviram para traçar a rota que as Irmãs Meireles mais tarde empreenderiam com notável e rara segurança.

A luta que Cidália teve de travar em Lisboa, para impor-se como cançonetista, foi titânica. Sozinha numa cidade estranha, de ambiente singularmente diverso daquele em que vivia Cidália teve que enfrentar inúmeras contrariedades, algumas das quais teriam feito desistir outra que não a jovem artista. Por isso o seu triunfo foi mais saboroso, tanto mais que foi alcançado exclusivamente à custa do seu próprio talento.

O trio surgiu posteriormente em 28 de maio de 1943. Foi uma surpresa e uma revelação. Rosária (nasceu em 11 de outubro de 1926) e Milita (nascida em 25 de setembro de 1928) mostraram-se dignas de sua categorizada irmã, e com ela passaram a formar o mais valioso conjunto vocal da Rádio Portuguesa. Harmonizaram-se assim, a voz doce da Cidália, e a voz quente e grave da Milita e a voz aguda, com requintes de boa escola, da pequena e graciosa Rosária.

Rosária Meireles (A Cena Muda, 1947)
Consagradas por um grande público, e pela crítica, exaltadas por toda a imprensa portuguesa sem exceção, o rádio não bastava já para corresponder à fama alcançada pelas três queridas artistas. E chegou o momento em que o Cinema luso as chamou para revelar Milita como artista de excepcionais qualidades e de jogo fisionômico prodigioso. "Um Homem às Direitas", belo filme dirigido por Brum do Canto, teve em Milita um dos seus melhores motivos de agrado.

Depois as três irmãs partiram para a Espanha, onde já eram conhecidas, e populares desde que, em março de 1945, haviam atuado no "Salon Rigat" (luxuoso salão de chá) em Barcelona, onde também gravaram alguns discos. Foram para Madrid filmar "O Diabo são Elas", sob a direção do cineasta húngaro Ladislau Vajda, que não poupou elogios às excelentes faculdades cinematográficas de Rosária (Quinhas) e da já experimentada Milita. Cidália, ainda desta vez, não filmou. Ela que fora a primeira a triunfar no rádio, seria a última a tentar o cinema.

De novo em Lisboa, as três artistas partiram para a deliciosa Ilha da Madeira, onde durante dois meses, atuaram com êxito na luxuosa boate Flamingo e, ainda, no Casino da Quinta da Vigia. Em Junho regressaram à capital portuguesa para reatar a sua carreira radiofônica.

A 12 de Abril de 1946, realizaram estas artistas o seu primeiro recital, no Teatro do Ginásio, que foi uma verdadeira noite de arte. Antes da partida para o Brasil desse valioso "trio", deu ele seu segundo recital, preparado em moldes diferentes do primeiro em que mais uma o público de Lisboa teve o ensejo de apreciar mais uma vez o valor e as possibilidades artísticas destas simpáticas moças. A traços largos é esta a história do "trio" Meireles, três raparigas bonitas que já levaram a sua arte aos centros mais importantes do País, e que lá fora muito honraram Portugal com a sua classe incomparável de artistas educadas e briosas.

Foi este "trio", como conjunto de rádio, que primeiro recebeu o batismo internacional levando ao Rádio Espanhol pelas suas estações de Madrid e Barcelona, a arte e as canções da terra portuguesa.

Milita Meireles (A Cena Muda, 1947)
Essas artistas em 1946 rejeitaram um contrato para atuar no Teatro Carlos Gomes, do Rio de Janeiro — por motivos de ordem comercial e ainda porque estavam ligadas a contratos de cinema, para os filmes "Os vizinhos do rés-do-chão" e "Aqui Portugal", esse filme em que Cidália fez sua estreia cinematográfica com grande êxito.

São os anjos que cantam! — é sempre a frase já corriqueira quando a gente ouve as irmãs Meireles. E sentimos vontade de olhar para essa Broadway enorme onde se encontram as outras estrelas, Dina Shore com luz sideral...

Cidália, Milita e Rosária, são de fato, três autênticas "estrelas" e com a vantagem de viverem apesar de tudo, menos distantes que as outras, as da América! Classe não lhes falta. Tem o mesmo estilo das grandes vedetes da rádio americana. São feitas da mesma massa, ainda que nascidas em Portugal. O timbre das suas vozes, as suas escalas, a afinação do seu conjunto é igual ao timbre, à escala e à afinação das Andrews, das Kings, das Roswell...

Cidália, Milita e Rosária — três passarionhos cantantes do Rádio Português, que podem ser do rádio de todo mundo! — internacionalizaram as mais localistas canções portuguesas, com a mesma facilidade com que assimilaram as melodias de Harlem ou de Nova Orleans. Aqui está um pouco da nossa conversa com as irmãs Meireles, às vésperas da partida das simpáticas artistas para o Rio.

Fomos surpreendê-las a fazerem as malas. E que grandes malas.

Repórter: — Estão fazendo as malas para a partida?

Cidália: — É verdade. Dentro de poucos dias lá vamos.

Repórter: — Vocês vão ter um grandioso êxito e, com certeza ficam por lá, como tem acontecido com outras artistas. A Beatriz Costa, por exemplo...

Rosária: — Não, não ficaremos. O nosso querido Portugal morreria de saudades e nós também!

Repórter: — E eu também!

Milita: — O nosso Quartel General é a Emissora Nacional de Lisboa. Mal andamos uns dias por fora, sentimos logo saudades da nossa terra e da nossa casa, onde nascemos para a vida artística. No Brasil, todavia, esperamos que as saudades sejam menores. Sempre ouvimos dizer que o Brasil é uma continuação de Portugal.

E as malas iam sendo pinhadas de vestidos e objetos de toalete enquanto a conversa prosseguiu, no mesmo tom alegre, com as três irmãs, que são três garotas do barulho!...

Cidália (que é muito viva e amiga de saber tudo): — Além do mais, o Brasil é muito bonito, não é mesmo?

Repórter: — Bonito?!... Maravilhoso. Vocês vão delirar quando virem a baía de Guanabara, o Pão de Açúcar, Copacabana e... não digo mais nada! Será melhor que vejam com seus próprios olhos, e me dêem depois as suas impressões.

Houve um silêncio. Todas ficaram pensativas.

Repórter: — Vocês vão só ao Rio?

Cidália: — Por ora só temos contrato com a Rádio Nacional, durante três meses. Só depois de lá estarmos, tomaremos resoluções definitivas.

Repórter: — E quanto ao repertório?

Rosária: — Levamos uma mala cheia. Olhe (aponta a mala). Uma reverendíssima mala, não acha?

Repórter: — A avaliar pela mala, é um reverendíssimo senhor repertório, não é verdade?!

Milita: — Tudo música portuguesa, 100% folclórica, 100% portuguesa.

E as três irmãs cada vez mais alegres, cantarolando, rindo e falando lá se iam, carregando malas e mais malas.

Cidália: — Há muito que desejávamos conhecer o Brasil! Oh! Como deve ser emocionante esta nossa viagem!

E amigos, posso assegurar-lhes ser esta umas das poucas oportunidades que têm de conhecer, através de interpretes exatas, o verdadeiro caráter do nosso folclore, que melhores embaixadoras não podia ter senão as bocas e os sorrisos das Meireles."

(Reportagem de Carmelino Callaya para  A Cena Muda)

Playlist





1 - Balada de Coimbra; 2 - Bola ao centro; 3 - Josezito; 4 - Roda mas não caias.

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Fontes: A Cena Muda, de 13/05/1947; Portugal através do Mundo.